quinta-feira, 15 de outubro de 2009

Algumas Palavras Necessárias!

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Bom dia, FELA!

A todos os FELAS do mundo

Bom dia, FELA
Bem vindo a toda esta merda chamada Brasil!
Filho disperso, onde quer que esteja assentado meu rosto coberto de passado
Ouço suas palavras proféticas se materializando nessa nossa Mãe traída.
Por onde quer que eu vá carrego também o cheiro dos esgotos dessa África que te coube
Transporto em meu próprio semblante o fenótipo comum desses parentes baixos
Que tentaram de todas as formas embranquecer tua negrura presidencial.
Eles não acreditam que você carrega a morte no bolso...

Sinto na pele que é mesmo verdade tuas rajadas de ironia e sarcasmo
Por onde transito, na condição de seu semelhante, não se vive sem, diariamente,
Aspirar as impurezas relativas do ar.
Justamente por isso você renasce, a cada dia,
No som em desalinho que trafica tua inquietação para outras terras madrastas.
A despeito do espaço e do tempo que me separam de ti em matéria bruta
Sei que, por assim dizer, teu sopro sonoro é tua arma, parindo meu coração em conflito
Tua poesia é uma corrente confortante, lembrando, despertando, recolhendo-me...
Não me harmonizo nos acordes tramados de cima pra baixo.

De narinas abertas ao vento contrário que sopra
Da imensa corrente ocidental que lava as almas perdidas de rumo,
Respiro atento a velha bosta fedorenta da submissão que atola os distraídos.

Boa tarde, FELA
Agora chego mais perto, para que eu possa tocar sem receio teu significado.
Tenho encontrado aqui a mesma escória que tem colocado a África andando pra trás.
Circulo nas ruas com o mesmo cuidado e a malandragem de sempre, Irmão.
É preciso estar ligeiro na esquiva, para não tomar porrada na cara.
Ver com os olhos da nuca, para não haver facas enterradas nas costas descobertas!
Os vermes pós-coloniais que se multiplicam em nosso meio ambiente
Se reproduzem dos mesmos parasitas daninhos que macularam tua história
Que agrediram por demais o teu templo
Na tentativa de alcançar o altar profundo de tua alma intocável de tão confiável!
A latrina do mundo grego e seus multiplicadores negros,
Do lado de cá do teu mundo, se estendem velozes a me procurar.
Também se prolifera pelos quintais dos nossos homens decentes a escória universal.


Aqui, nesta fatia de país chamada exclusão, passeio ao noturno dos dias
Sob a visão de corpos pretos putrefatos iluminados ao luar.
Também ergui monumentos de ira...
Por não revelarem a face tão familiar do soldado desconhecido
Que nos extermina como insetos em praça pública.

Nas paisagens dos jardins do entorno das mansões insensatas
Os ladrões internacionais estão ao telefone,
Tramando a grande confraternização do renascimento da raça que nunca morreu.
Nossos militantes galantes e doutores abnegados estão de olhos inclinados
A espera da viagem oficial em primeira classe e do aconchego da suíte de luxo.
Esperançosos como galinhas que lutam grão por grão
Do milho caído do alto das mãos dos que lhes engordam para o abate.
Tudo devidamente pago pelas migalhas da fraternidade do patrão ocidental.
Tudo sob encomenda para a preservação do turismo ao inferno.
Tudo sob a promessa de solidariedade aos molekes que traíram os heróis traídos!

Nas calçadas arborizadas do centro cívico do oportunismo,
Os vândalos empossados aproveitam a brisa que brota do centro da ambição.
Eles se servem do discurso nacional adoçado no chá do esquecimento.
Os mesmos vagabundos também, aqui, estão no poder,
Atraindo as almas sebosas formadas em filas compridas e sorridentes,
Moscas felizes que sobrevoam rasantes as fezes que sufocam os ares
A espera da hora exata de lamber as botas do chefe,
A espera da hora oculta de oferendar a delação premiada!

Boa noite, FELA
Queira sentar-se comigo, para uma caneca do café forte
Que perfuma o ar denso das noites de visita do santo ofício.

Permita-me um dedo de prosa regada ao amargo de minhas lembranças,
Que vazam pelo caldo escuro da divergência que me mantém vivo,
Filtrado na bandagem das feridas abertas desde as estocadas antepassadas.
A vigília é constante aos que compram e vendem a vida dos outros,
Que etiquetam as consciências com os algarismos baratos das mentalidades coloniais.
Mas ainda não perdi a calma, Presidente.
A coluna ereta e a cabeça ao alto são os vestígios da minha permanência
Ainda que cada dia que passa seja a véspera da hora do sinal do general em comando,
Para que barbarizem as colunas de minha República Kalakuta;
Para que lancem os meus restos do andar mais alto quebrando os ossos de meu sono
Expurgada a insônia na aurora de minha morada em chamas.

Bom dia, Irmão
Pode ter certeza que nunca oferecerei a outra face.
Nos descaminhos do revide, reparto meus nãos com os descontentes.
Aprendo, com um elo que vem de você, a verdade sisuda da África que incomoda
Revelada nas nódoas de sangue das fardas dos que cortaram as cabeças.
Teu corpo escuro presente empalidece a falácia arrogante do renascimento
Dos que nunca morreram na luta pela unificação das demandas.
Teu pan-africanismo implosivo faz as elites pós-coloniais caírem para dentro.
Soterra em si mesmos os que, na surdina covarde e na conspiração barulhenta,
Explodiram a reunião dos rebelados com causa.

Estou ansioso para colocar minha comuna no centro do universo.
Rejeito categoricamente a estrada marginal que me guiava para fora do problema.
Desconfio da beleza sem tensão que tem tomado esta palavra periferia
Sim, Parceiro, Eu sei que sou o centro do problema.
Minha larga avenida central pavimenta os preconceitos rumo ao olho do furacão.
Meu andar esguio de fera indomável expele os macacos que saltam pedindo bananas.
A febre amarela e a extensão da malária não afetaram meu cavalheirismo,
Porque a minha gentileza de pantera não admite que me afaguem feito um bichano.

Boa tarde, Fela
Em mim já nasceu está nascendo e nascerá teu movimento do povo.
Afinal também faço parte do teu povo em movimento...


(Nelson Maca)



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